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Fabrício Ramos

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setembro 27, 2018

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15:17

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O fornecimento e a não-vinculação trabalhista: protegendo sua empresa

Por Fabrício Ramos

O modelo de negócio de quase todas as empresas depende, em algum grau, de relações comerciais que se baseiam no fornecimento de bens ou serviços por outras companhias, potencializando a circulação de mercadorias de maneira mais eficiente. Afinal, dificilmente, uma empresa conseguirá internalizar todas as etapas produtivas dentro de si.

No entanto, mesmo se tratando de companhias diferentes, com personalidades jurídicas distintas e separação societária é possível que haja a responsabilização subsidiária da contratante por obrigações trabalhistas da contratada, caso a Justiça identifique o serviço como uma espécie de terceirização (Súmula 331, IV do Tribunal Superior do Trabalho – TST).

 

O risco trabalhista

 

É inquestionável que o fornecimento de produtos difere da terceirização de uma atividade-meio ou atividade-fim da empresa; se trata de uma parceria comercial entre dois entes empresariais, sem ingerência ou vinculação trabalhista. Entretanto, o fornecimento de serviços pode se aproximar bastante da figura da terceirização, aumentando muito o risco de eventuais condenações trabalhistas para empresas que participam desse tipo de contrato.

Portanto, é inquestionável que o fornecimento de produtos não está isento de riscos. Tem-se como exemplo o fornecimento de alimentos para empresas: mesmo sendo pacificado na jurisprudência que o fornecimento de alimentos não consistiria terceirização, impossibilitando a responsabilização, há julgados em que, diante do contorno fático, o próprio TST reconheceu que poderia ser aplicada a responsabilidade subsidiária da companhia contratante do serviço.

Dessa forma, o empregado do fornecedor pode tentar estender a responsabilidade ao contratante, seja porque há real confusão em relação a quem é seu empregador ou pelo simples fato do contratante ter, geralmente, bolsos mais fundos, o que facilitaria sua indenização.

Diante desse cenário incerto, as empresas que querem se prevenir dessa ameaça podem articular diferentes remédios, os quais podem estar integrados no contrato de fornecimento.

 

Como tentar mitigar o risco trabalhista em operações de fornecimento?

Muito do trabalho de empresários/empresárias e de advogados/advogadas consiste em estruturar mecanismos para proteger o negócio de riscos evitáveis, seja por meio de soluções empresariais ou jurídicas.

 

A resposta empresarial

Uma possível saída para o desafio da contratante em não ser responsabilizada por passivos trabalhistas da fornecedora é, primeiramente, evitar contratar fornecedores que apresentem elevado grau de risco. Analisar o histórico da companhia, avaliar as práticas trabalhistas do fornecedor e pesquisar sobre eventuais condenações prévias são alternativas interessantes que empresas diligentes podem elaborar.

É certo que exigir esse comportamento da empresa enseja um custo; entretanto, o realizar uma due diligence, background checks ou uma acurada pesquisa de mercado podem evitar gastos altíssimos no longo prazo, à medida que será possível ter mais clareza sobre o parceiro comercial.

Essa é apenas uma saída possível para evitar o problema, pois é possível que, mesmo sendo diligente, a companhia contrate uma fornecedora que tenha ou terá passivos trabalhistas, havendo a chance de, judicialmente, ser obrigada a indenizar o funcionário da contratada. Dessa forma, apesar de ser uma parte importante da solução a resposta empresarial precisa ser complementada jurídica e contratualmente.

 

A resposta jurídica e contratual

Para complementar a diligência da companhia em contratar empresas confiáveis no mercado, há a possibilidade de, através de remédios jurídicos, combater os riscos de uma eventual cobrança trabalhista do funcionário da empresa fornecedora.

O contrato de fornecimento estabelecido entre as partes regerá uma relação comercial, sendo fundamental para garantir estabilidade e definir as responsabilidades dos contratantes. Nesse sentido, é o instrumento adequado para prever a chamada cláusula de desvinculação trabalhista.

A cláusula de desvinculação trabalhista permite que os contratantes reconheçam que inexiste relação de subordinação jurídica-econômica e vínculo trabalhista entre eles. Além disso, afasta a responsabilidade mútua por todos os encargos de natureza trabalhista e previdenciária da contraparte.

Entretanto, como já mencionamos, isso pode ainda não ser suficiente, perante um Tribunal, para afastar a responsabilidade pelo pagamento de passivos trabalhistas.

Para proteger ainda mais as partes contra uma indesejada vinculação, a cláusula traz a obrigação da fornecedora em contratar um seguro contra eventuais passivos trabalhistas. Assim, na eventualidade de alguma reclamação trabalhista, o seguro poderá ser acionado para fazer frente ao passivo no lugar da empresa contratante do fornecimento.

Além disso, outra obrigação interessante é que, em caso de litígio trabalhista, a fornecedora se obrigue a pedir a exclusão da contratante do pólo passivo e, em face de eventual condenação, que haja o direito da contratante de exigir da fornecedora o pagamento pelos custos decorrentes da decisão judicial, incluindo honorários advocatícios.

Além disso, para alinhar essa estratégia com a resposta empresarial ao risco, é interessante para quem contrata exigir que, durante o curso do fornecimento, seja possível fiscalizar o cumprimento das obrigações trabalhistas e previdenciárias pela fornecedora, sob pena de haver retenção dos pagamentos.

Essa medida não só é positiva por garantir certo controle durante a prestação do serviço, mas também porque afasta a possibilidade de que a empresa seja enquadrada pelos Tribunais como negligente perante a atuação de sua contratada. Dessa forma,  se comprovado que o tomador de serviços promoveu a fiscalização quanto à regularidade do pagamento das obrigações trabalhistas, não há que se falar em responsabilidade subsidiária. Novamente há uma imposição de custo à contratante, mas que pode valer à pena,, especialmente no caso de empresas de médio e grande porte.

Por fim, vale ainda mencionar que a descoberta de irregularidades durante a fiscalização das obrigações trabalhistas da empresa fornecedora pode autorizar a rescisão do contrato sem o pagamento de qualquer multa. Dessa forma, a companhia mitigará todos os riscos trabalhistas decorrentes da relação comercial.

 

Conclusão

Contratar o fornecimento de serviços ou produtos, independentemente de sua atividade econômica, gera o risco de tribunais ignorarem a natureza contratual da relação e aplicarem a legislação referente a modelos de terceirização. Entretanto, existem proteções possíveis contra a eventual responsabilização subsidiária da contratante frente aos passivos trabalhistas, que devem ser arquitetadas pela empresa e pelos advogadas e advogadas.

Nesse sentido, nunca é demais evitar risco desnecessários, ainda mais quando a solução não gera outros custos, como é o caso da inserção de uma cláusula de desvinculação trabalhista. Mais ainda, se economicamente viável, é interessante estruturar respostas empresariais contra o risco de contratar empresas suscetíveis a passivos trabalhistas.

Fabrício Ramos

fabricio.ramos@lexio.legal

Desenvolvedor jurídico e comercial do Lexio.

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